Imagem acima: cafeigravura

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Manhattan

Corre a estrada
Escorre da testa
Suor congelado
Pulmões queimados

Respira errado
A dor do lado
Um pé no outro
Mãos no chão

Ergue o ânimo
Enxuga o joelho
Arde a vista
Buço salgado

Cospe o ar
A testa lateja
O sangue desce
Mira o muro

Finca os dedos
Pisa as flores
Conta as linhas
Tijolos acesos

Soca a porta
Tosse os nervos
Deseja a luz
Antes dos passos

Surge a menina
Mesmas bochechas
Um novo pedido
Mais uma noite.

Sim

Sim
Ao menos uma vez
Gostaria de dizer
Não.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Lenda dó ré mi

Indiozinho viu a lua despencar
Desesperado, escalou as estrelas
Não a queria partida em pedaços.

Pois lá acreditava morar indiazinha
Quando dos teus braços escapulia
Mais ligeira que caminho de cupim.

Com esforço agarrou-se aos astros
Mas o pobre desastrado escorregou
E caiu no chão, os pés machucados.

Ingênuo, indiozinho não percebeu
Indiazinha não habitava o céu
Mas um macerado coração
Sim, índio bobo, o teu!

2001


                                  Verso
                       Atrai              Contra
                                  Verso
              Embora                         Opõe
                                Inverso
       Jamais                                        Certo
                               Adverso
              Gerando                    Tornado
                              Universo

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Inquérito (II)

O primeiro suspeito

Primeiro porque óbvio

Antagonista irritado
Contraparte que vocifera
Contra todo espaço
                            vago

largado pela insinuante vítima


Não ameaça, mas decreta

Sem pestanejar, incisivo
Comanda
            Choca-se
                        Brada
Contra a injustiça, pela razão
Construída a partir da paixão

Se não aniquila

                     protege
Antes de assustar-se
                     exige
Domínio completo
Sobre pobres verbos inertes

Porém a vítima jamais mataria

                apenas condenaria
Ser maldita, dona da feitiçaria
Quem a fez amar como criatura
                                 arredia

Inquérito (I)

Quem matou o ponto de interrogação

Foi o senso comum
Enquanto fundamento filosófico
Ou instrumental sociológico

Foi a certeza absoluta
Mãe e filha de preconceitos
E deles ainda mãe e filha
Num pensamento incestuoso

Foi o indivíduo questionador
Debatendo-se no meio da turba
Desesperado por marcar-se singular

Quem matou o ponto de interrogação